22.1.07
As Múltiplas Falas do Português
Os temas relacionados com o uso da Língua Portuguesa continuam a atrair a minha atenção.
Recentemente, vim a saber que os actores portugueses convidados a participar nas telenovelas exclusivamente brasileiras, não nas luso-brasileiras, passam por uma espécie de ensaio de dicção, em que lhes é exigida maior clareza na pronunciação das palavras.
Até aqui não me parece mal, porque a preocupação com a percepção dos textos, por parte de quem vai produzir espectáculos para o público em geral, é naturalmente louvável. Mas já acho estranho que os actores lusos apareçam depois a falar com sotaque brasileiro, numa situação caricata para quem os conhece como sendo portugueses.
Admito que o façam de sua livre vontade, que até encontrem piada nesse exercício, que o encarem como mais uma tarefa de representação, na imensa variedade de papéis que um actor tem de assumir na sua versátil e incerta carreira.
Como princípio, no entanto, acho lamentável, porque não é natural neles, nem é saudável para a compreensão recíproca dos falantes da Língua Portuguesa.
Custa-me a crer que os Brasileiros não entendam o português europeu, pesem todos os defeitos de pronúncia que, de facto, aqui existem, alguns mesmo agravados pelo actual ensino da língua : deficiente, desleixado, excessivamente permissivo ao erro, à incorrecção, à falta de rigor, etc., etc., na Língua, como nas demais disciplinas.
Bastaria um pouco mais de atenção, de prática e de exigência, por parte dos Professores e do Ministério da Educação, para que este aspecto da deficiente articulação do Português europeu melhorasse com o tempo.
E, nos actores, de igual modo, com algum treino específico, boa orientação e maior cuidado na articulação das palavras, a clareza da fala ganharia imediatamente, com vantagem para todos os utentes da Língua que assim se compreenderiam melhor uns aos outros.
Segundo tenho ouvido a especialistas, o nosso modo de falar português perde sonoridade desde há muito, por particular fenómeno de evolução linguística, que aqui se desenvolveu, no sentido de uma mais rápida articulação, com a consequente perda de clareza na dicção. Falamos comendo letras e sílabas, quase só se ouvindo, em cada palavra, a chamada sílaba tónica, ficando as restantes, as átonas, quase imperceptíveis.
Ao contrário, no Brasil e em África, a fala é mais pausada, permitindo a quem ouve a percepção das diversas sílabas de cada palavra e não só a da sílaba tónica.
No Brasil, em particular, apesar das variantes de pronúncia entre Estados, distinguíveis mesmo para alguém pouco experimentado, de um modo geral, a Língua é falada com grande clareza, com perfeita distinção de sílabas, o que faz com que, para um estrangeiro que deseje aprender Português, se torne mais fácil a aprendizagem do idioma com cidadãos brasileiros do que com portugueses.
Já para o domínio das regras gramaticais, ouço dizer aos estrangeiros que preferem o contacto com a nossa norma, por ser mais regular, uniforme, concorde com os cânones da Língua.
A falta de contacto dos brasileiros com o português europeu, pelo fraco e desequilibrado intercâmbio cultural actual torna-os alheios à nossa singularidade. Isto a par de alguma falta de vontade, como é por de mais evidente.
Nunca as diferenças de sotaque e de pronunciação impediram as largas dezenas de milhares de brasileiros que vivem actualmente em Portugal de entender os portugueses. Essa dificuldade só se torna aparentemente inultrapassável, na posição inversa, isto é, quando os portugueses se encontram no Brasil. Coisa tanto mais estranha, quanto sabemos que durante décadas a fio muitos milhares de nossos compatriotas procuraram terras de Vera Cruz, como emigrantes, e por lá se radicaram, muitos para sempre, optando pela cidadania da nova Nação.
Consta que até aos anos 50 do século passado, as Companhias de Teatro portuguesas iam com frequência ao Brasil, eram bastante apreciadas e o sotaque português chegava a ser adoptado por actores brasileiros. Tudo isto hoje é passado, completamente esquecido. O Brasil perdeu o hábito de ouvir cantores e artistas de teatro ou de cinema portugueses e, com essa perda, veio a estranheza actual com que recebe a norma linguística europeia.
Estas coisas devem dizer-se, sem receio de desagradar, porque são reais e não visam o insulto, mas a discussão de ideias, para melhorar a nossa compreensão recíproca.
Sempre convivi com a cultura brasileira, desde a música, que comecei a ouvir ainda na pré-adolescência, com o Roberto Carlos, depois, nos bailes, a sua presença era habitual e ficaram-me dela nomes gratos como Elis Regina, Chico Buarque, este mais do que qualquer outro sempre me acompanhou pela vida fora. Na literatura, comecei, pela mão do meu Professor, tantas vezes aqui mencionado, José Pedro Machado, pelos clássicos, como José de Alencar, Euclides da Cunha, Machado de Assis, Coelho Neto, Rui Barbosa, Manuel Bandeira, Cecília Meireles, Carlos Drummond de Andrade, Érico Veríssimo,Vinicius de Morais, Jorge Amado, etc.
No estudo da Língua, também me familiarizei com alguns vultos da Filologia do Brasil, desde os mais antigos mestres, como Mário Barreto, Ernesto Carneiro, Said Ali, José Sá Nunes, Antenor Nascentes, Serafim Neto, Silveira Bueno, Afrânio Peixoto, até aos hodiernos Napoleão Mendes de Almeida, Mattoso Câmara Jr., Celso Cunha, Evanildo Bechara, Domingos Cegalla, etc., a par de outros, cujos nomes de momento não consigo evocar, mas cujas obras jazem ali numas estantes mais recônditas, há longo tempo comigo.
Muitos destes nomes enobreceram a nossa cultura linguística comum, criando-nos um património que é nosso dever estimar e preservar. Mas, para isso, tem de haver conhecimento recíproco, que assenta na vontade de o tornar efectivo e não na busca de forçados motivos ou meras escusas erigidas como barreiras a um verdadeiro intercâmbio.
Aquilo que, sistematicamente, fazem no Brasil, com filmes e telenovelas portugueses, dobrados ou legendados para poderem circular, em nada ajuda a nossa desejável mútua compreensão.
A Língua Portuguesa pode conviver com variados sotaques e algumas especificidades. Mesmo aqui entre nós, temos diferenças de pronúncia muito acentuadas.
O falar de um minhoto contrasta com os de um transmontano, beirão, alentejano, algarvio, madeirense ou açoriano, para só citar os mais típicos, sem contar com os de um Cabo Verdiano, São Tomense, Guineense, Angolano, Moçambicano, Indiano, Timorense ou Macaense, estes últimos citados porque ainda nessas paragens, embora com dificuldade, consegue sobreviver o idioma de Camões, em lugares que ele próprio frequentou, na sua aventurosa quanto infeliz peregrinação por terras do Oriente.
Mas estas considerações não devem servir para desculpar as faltas, os erros e as incorrecções que todos praticamos no uso da nossa Língua comum. Alguns há, muito graves, porque corrompem a sua natureza. Refiro-me a um péssimo hábito de os brasileiros misturarem os tratamentos, violando arbitrariamente as regras da sintaxe, que nenhuma variante normativa da Língua pode consentir.
Frases como «Você já falou com o teu pai ? Não ? Então, vai falar, não seja rancoroso!», «Eu vi-lhe no cinema. Você estava conversando com tua prima, não nega!», etc., etc, nunca poderão ser tidas como normais no Português, nem em nenhuma língua de raiz latina.
Imagine-se como aquilo ficaria em Francês, Italiano ou Castelhano. Nem sequer em Alemão, que não é idioma do mesmo ramo, aquilo é possível. E, no entanto, é assim que praticamente todos os actores brasileiros falam nas telenovelas que passam na nossa TV.
Aqui não pode haver transigência da nossa parte, nem no Brasil deveriam aceitar tal prática. A Gramática não o permite. A Língua não comporta tamanhos aleijões.
Se viermos a acolher tais irregularidades estaremos caminhando para o caos linguístico, para o puro arbítrio, para uma coisa discricionariamente flexível, moldável, a caminho de uma rápida desarticulação, que redundará na realidade de uma nova língua, que já não poderá ser designada Portuguesa, mas porventura Brasileira.
Será isto que do outro lado do Atlântico se persegue ? Não creio que o seja, pelo menos por enquanto. Daqui por centenas de anos, admito-o com toda a naturalidade. Até lá, cabe-nos preservar a unidade da Língua, cultivando-a dentro das especificidades naturais, não disruptivas, se isto assim se pode dizer, que ela comporta nos diversos continentes onde logrou implantar-se.
Lamento que pouca gente, especialistas do idioma e de outros domínios correlatos, se interesse por estes temas. Raramente encontro nos jornais ou na blogosfera debates sobre estes assuntos.
Ultimamente, a TLEBS (Terminologia Linguística para os Ensinos Básico e Secundário) tem animado um pouco a discussão sobre a aprendizagem do idioma. Nela se tem distinguido, pela constância, pela acutilância e pela consistência da argumentação, o nosso ilustre Deputado Europeu Vasco Graça Moura, intelectual de muitos méritos e larga obra publicada.
Que não lhe falte o fôlego interventivo, aqui também, porque a sua voz é bastante escutada e acrescenta saber ao tema em debate. Só é pena que a sua verve e a sua poderosa argumentação sejam tanta vez desperdiçadas e malbaratadas na defesa de gente menor, sem credibilidade, nem honorabilidade que justifiquem tanto empenho intelectual.
Mas, enfim, ele lá saberá porque há-de terçar tanta lançada, vã, a meu ver, claro, o que até lhe diminui a autoridade, ardua e dignamente conquistada noutros campos bem mais exigentes.
Mas isto já seria entrar em matéria mais política, a política algo degradada, a dos partidos, saindo daquela em que estávamos, mais cultural, terreno em que pelo menos se respira melhor, em que o ar não se acha tão fétido. Ficará para outra ocasião.
AV_Lisboa, 22 de Janeiro de 2007
Recentemente, vim a saber que os actores portugueses convidados a participar nas telenovelas exclusivamente brasileiras, não nas luso-brasileiras, passam por uma espécie de ensaio de dicção, em que lhes é exigida maior clareza na pronunciação das palavras.
Até aqui não me parece mal, porque a preocupação com a percepção dos textos, por parte de quem vai produzir espectáculos para o público em geral, é naturalmente louvável. Mas já acho estranho que os actores lusos apareçam depois a falar com sotaque brasileiro, numa situação caricata para quem os conhece como sendo portugueses.
Admito que o façam de sua livre vontade, que até encontrem piada nesse exercício, que o encarem como mais uma tarefa de representação, na imensa variedade de papéis que um actor tem de assumir na sua versátil e incerta carreira.
Como princípio, no entanto, acho lamentável, porque não é natural neles, nem é saudável para a compreensão recíproca dos falantes da Língua Portuguesa.
Custa-me a crer que os Brasileiros não entendam o português europeu, pesem todos os defeitos de pronúncia que, de facto, aqui existem, alguns mesmo agravados pelo actual ensino da língua : deficiente, desleixado, excessivamente permissivo ao erro, à incorrecção, à falta de rigor, etc., etc., na Língua, como nas demais disciplinas.
Bastaria um pouco mais de atenção, de prática e de exigência, por parte dos Professores e do Ministério da Educação, para que este aspecto da deficiente articulação do Português europeu melhorasse com o tempo.
E, nos actores, de igual modo, com algum treino específico, boa orientação e maior cuidado na articulação das palavras, a clareza da fala ganharia imediatamente, com vantagem para todos os utentes da Língua que assim se compreenderiam melhor uns aos outros.
Segundo tenho ouvido a especialistas, o nosso modo de falar português perde sonoridade desde há muito, por particular fenómeno de evolução linguística, que aqui se desenvolveu, no sentido de uma mais rápida articulação, com a consequente perda de clareza na dicção. Falamos comendo letras e sílabas, quase só se ouvindo, em cada palavra, a chamada sílaba tónica, ficando as restantes, as átonas, quase imperceptíveis.
Ao contrário, no Brasil e em África, a fala é mais pausada, permitindo a quem ouve a percepção das diversas sílabas de cada palavra e não só a da sílaba tónica.
No Brasil, em particular, apesar das variantes de pronúncia entre Estados, distinguíveis mesmo para alguém pouco experimentado, de um modo geral, a Língua é falada com grande clareza, com perfeita distinção de sílabas, o que faz com que, para um estrangeiro que deseje aprender Português, se torne mais fácil a aprendizagem do idioma com cidadãos brasileiros do que com portugueses.
Já para o domínio das regras gramaticais, ouço dizer aos estrangeiros que preferem o contacto com a nossa norma, por ser mais regular, uniforme, concorde com os cânones da Língua.
A falta de contacto dos brasileiros com o português europeu, pelo fraco e desequilibrado intercâmbio cultural actual torna-os alheios à nossa singularidade. Isto a par de alguma falta de vontade, como é por de mais evidente.
Nunca as diferenças de sotaque e de pronunciação impediram as largas dezenas de milhares de brasileiros que vivem actualmente em Portugal de entender os portugueses. Essa dificuldade só se torna aparentemente inultrapassável, na posição inversa, isto é, quando os portugueses se encontram no Brasil. Coisa tanto mais estranha, quanto sabemos que durante décadas a fio muitos milhares de nossos compatriotas procuraram terras de Vera Cruz, como emigrantes, e por lá se radicaram, muitos para sempre, optando pela cidadania da nova Nação.
Consta que até aos anos 50 do século passado, as Companhias de Teatro portuguesas iam com frequência ao Brasil, eram bastante apreciadas e o sotaque português chegava a ser adoptado por actores brasileiros. Tudo isto hoje é passado, completamente esquecido. O Brasil perdeu o hábito de ouvir cantores e artistas de teatro ou de cinema portugueses e, com essa perda, veio a estranheza actual com que recebe a norma linguística europeia.
Estas coisas devem dizer-se, sem receio de desagradar, porque são reais e não visam o insulto, mas a discussão de ideias, para melhorar a nossa compreensão recíproca.
Sempre convivi com a cultura brasileira, desde a música, que comecei a ouvir ainda na pré-adolescência, com o Roberto Carlos, depois, nos bailes, a sua presença era habitual e ficaram-me dela nomes gratos como Elis Regina, Chico Buarque, este mais do que qualquer outro sempre me acompanhou pela vida fora. Na literatura, comecei, pela mão do meu Professor, tantas vezes aqui mencionado, José Pedro Machado, pelos clássicos, como José de Alencar, Euclides da Cunha, Machado de Assis, Coelho Neto, Rui Barbosa, Manuel Bandeira, Cecília Meireles, Carlos Drummond de Andrade, Érico Veríssimo,Vinicius de Morais, Jorge Amado, etc.
No estudo da Língua, também me familiarizei com alguns vultos da Filologia do Brasil, desde os mais antigos mestres, como Mário Barreto, Ernesto Carneiro, Said Ali, José Sá Nunes, Antenor Nascentes, Serafim Neto, Silveira Bueno, Afrânio Peixoto, até aos hodiernos Napoleão Mendes de Almeida, Mattoso Câmara Jr., Celso Cunha, Evanildo Bechara, Domingos Cegalla, etc., a par de outros, cujos nomes de momento não consigo evocar, mas cujas obras jazem ali numas estantes mais recônditas, há longo tempo comigo.
Muitos destes nomes enobreceram a nossa cultura linguística comum, criando-nos um património que é nosso dever estimar e preservar. Mas, para isso, tem de haver conhecimento recíproco, que assenta na vontade de o tornar efectivo e não na busca de forçados motivos ou meras escusas erigidas como barreiras a um verdadeiro intercâmbio.
Aquilo que, sistematicamente, fazem no Brasil, com filmes e telenovelas portugueses, dobrados ou legendados para poderem circular, em nada ajuda a nossa desejável mútua compreensão.
A Língua Portuguesa pode conviver com variados sotaques e algumas especificidades. Mesmo aqui entre nós, temos diferenças de pronúncia muito acentuadas.
O falar de um minhoto contrasta com os de um transmontano, beirão, alentejano, algarvio, madeirense ou açoriano, para só citar os mais típicos, sem contar com os de um Cabo Verdiano, São Tomense, Guineense, Angolano, Moçambicano, Indiano, Timorense ou Macaense, estes últimos citados porque ainda nessas paragens, embora com dificuldade, consegue sobreviver o idioma de Camões, em lugares que ele próprio frequentou, na sua aventurosa quanto infeliz peregrinação por terras do Oriente.
Mas estas considerações não devem servir para desculpar as faltas, os erros e as incorrecções que todos praticamos no uso da nossa Língua comum. Alguns há, muito graves, porque corrompem a sua natureza. Refiro-me a um péssimo hábito de os brasileiros misturarem os tratamentos, violando arbitrariamente as regras da sintaxe, que nenhuma variante normativa da Língua pode consentir.
Frases como «Você já falou com o teu pai ? Não ? Então, vai falar, não seja rancoroso!», «Eu vi-lhe no cinema. Você estava conversando com tua prima, não nega!», etc., etc, nunca poderão ser tidas como normais no Português, nem em nenhuma língua de raiz latina.
Imagine-se como aquilo ficaria em Francês, Italiano ou Castelhano. Nem sequer em Alemão, que não é idioma do mesmo ramo, aquilo é possível. E, no entanto, é assim que praticamente todos os actores brasileiros falam nas telenovelas que passam na nossa TV.
Aqui não pode haver transigência da nossa parte, nem no Brasil deveriam aceitar tal prática. A Gramática não o permite. A Língua não comporta tamanhos aleijões.
Se viermos a acolher tais irregularidades estaremos caminhando para o caos linguístico, para o puro arbítrio, para uma coisa discricionariamente flexível, moldável, a caminho de uma rápida desarticulação, que redundará na realidade de uma nova língua, que já não poderá ser designada Portuguesa, mas porventura Brasileira.
Será isto que do outro lado do Atlântico se persegue ? Não creio que o seja, pelo menos por enquanto. Daqui por centenas de anos, admito-o com toda a naturalidade. Até lá, cabe-nos preservar a unidade da Língua, cultivando-a dentro das especificidades naturais, não disruptivas, se isto assim se pode dizer, que ela comporta nos diversos continentes onde logrou implantar-se.
Lamento que pouca gente, especialistas do idioma e de outros domínios correlatos, se interesse por estes temas. Raramente encontro nos jornais ou na blogosfera debates sobre estes assuntos.
Ultimamente, a TLEBS (Terminologia Linguística para os Ensinos Básico e Secundário) tem animado um pouco a discussão sobre a aprendizagem do idioma. Nela se tem distinguido, pela constância, pela acutilância e pela consistência da argumentação, o nosso ilustre Deputado Europeu Vasco Graça Moura, intelectual de muitos méritos e larga obra publicada.
Que não lhe falte o fôlego interventivo, aqui também, porque a sua voz é bastante escutada e acrescenta saber ao tema em debate. Só é pena que a sua verve e a sua poderosa argumentação sejam tanta vez desperdiçadas e malbaratadas na defesa de gente menor, sem credibilidade, nem honorabilidade que justifiquem tanto empenho intelectual.
Mas, enfim, ele lá saberá porque há-de terçar tanta lançada, vã, a meu ver, claro, o que até lhe diminui a autoridade, ardua e dignamente conquistada noutros campos bem mais exigentes.
Mas isto já seria entrar em matéria mais política, a política algo degradada, a dos partidos, saindo daquela em que estávamos, mais cultural, terreno em que pelo menos se respira melhor, em que o ar não se acha tão fétido. Ficará para outra ocasião.
AV_Lisboa, 22 de Janeiro de 2007
7.1.07
A Apresentação do Livro do Dr. José Pedro Machado
Na continuação do artigo anterior, corroborando um comentário aqui deixado por um leitor antigo desta tribuna e sem presunção nenhuma, volto a afirmar que me tenho empenhado bastante na divulgação do nome e da obra de José Pedro Machado, já desde antes da sua morte e mais ainda depois dela. Considero que com tal determinação apenas cumpro a minha estrita obrigação.
Não somos assim tão pródigos em valores humanos que nos possamos dar ao luxo de deixar passar despercebido um vulto intelectual e cívico desta categoria. Seríamos indignos do seu exemplo, se tal acontecesse.
Por minha parte, continuarei este combate pela difusão e pelo reconhecimento da obra deste eminente intelectual português, paradigma de comportamento cívico a quaisquer títulos invocados, caso ainda mais extraordinário nos tempos frouxos, apagados de virtude em que vivemos.
A cerimónia singela que a Livraria Portugal organizou, na passada quinta-feira ao fim da tarde, com a modesta concorrência registada, quadra, no entanto, com o perfil ético do homenageado, superiormente frugal, espartano, como sempre o conhecemos, impassível e perseverante ante os mais variados óbices e dificuldades que se lhe ofereciam no caminho.
Se se tratasse da apresentação de uma qualquer futilidade mundana, teríamos provavelmente centenas de pessoas amontoadas até à porta do estabelecimento, como se tem visto ultimamente em tantos designados eventos que apenas anunciam escândalos ou perversidades.
Ainda assim, acorreram suficientes pessoas conhecedoras da figura do insigne académico homenageado, apreciadoras do seu trabalho e do seu exemplo cívico, que mostraram interesse e sensibilidade pelos valores intelectuais e éticos que ele exuberantemente demonstrou na sua longa prática quotidiana.
Ficámos até muito congratulados por termos sabido que a Academia Portuguesa da História pondera a hipótese de reeditar a tradução directa do árabe para a nossa língua do Alcorão feita por José Pedro Machado, obra singular e absolutamente pioneira em Portugal, tanto quanto julgo saber, em que este académico trabalhou afincadamente durante cerca de 15 anos até a dar à estampa em 1979.
Na altura, a obra volumosa, de mais de 750 páginas, que JPM, arabista emérito, enriqueceu com numerosas notas explicativas, em que ficou bem patente a sua vasta erudição filológica, nas suas diversas disciplinas complementares, foi editada sob o patrocínio da Junta de Investigações Científicas do Ultramar, com um prefácio do Dr. Suleiman Vali Mamede, então presidente da Comunidade Islâmica Portuguesa de Lisboa.
Rapidamente esta obra se esgotou, só estando hoje disponível em boas bibliotecas ou porventura nas estantes de um Alfarrabista mais criterioso. A Academia Portuguesa da História prestaria um serviço de inestimável valor cultural a toda a Comunidade se promovesse a reedição deste notável trabalho de José Pedro Machado.
O mesmo se poderia dizer de outras obras da autoria ou da coordenação de JPM, que se encontram há muito inacessíveis ao público leitor. Entre elas citarei o chamado Dicionário de Morais, em 12 grossos volumes, que ele ainda coordenou, na sua 10ª edição, de 1959, tendo contado também com a colaboração de Augusto Moreno e Cardoso Júnior.
Nesta portentosa obra está feita a mais abundante cópia de abonações de vocábulos usados por cultores exímios da Língua, de todas as épocas consideradas, e não quase só dos últimos dois séculos, como sucedeu com as abonações do recente Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa, saído em 2001, na Editorial Verbo.
Este Dicionário da Academia, que havia parado na letra A, no longínquo ano de 1793, viu finalmente a luz do dia, na sua edição completa de 2001. Mas para isso teve de contar com largos subsídios financeiros da Fundação Calouste Gulbenkian, com dezenas de professores do Ensino Secundário dispensados a tempo inteiro pelo Ministério da Educação, bem como beneficiou da utilização da tecnologia mais recente adequada à elaboração deste tipo de obras.
Apesar de tantos meios e da reputada orientação do Prof. Dr. Malaca Casteleiro, Presidente do Instituto de Lexicologia e Lexicografia da Academia das Ciências, este importante Dicionário, pela sua capacidade caucionadora, saiu com inexplicáveis omissões, como por ex. : asinha/depressa, ao mesmo tempo que acolhia vocábulos, cujo uso sempre fora repudiado por professores de todos os graus de Ensino, como o célebre bué e outros – muitos – vocábulos espúrios ou chulismos de mau gosto, que apenas caberiam num dicionário de calão.
Várias pessoas chamaram a atenção para os incompreensíveis critérios do Prof. Malaca, entre eles, Vasco Graça Moura, que, com vários exemplos, demonstrou as incongruências dos mesmos presentes no tão conceituado dicionário.
Se tais deficiências não forem eliminadas em futuras edições, estaremos perante um caso de esbanjamento de recursos e de falta de sentido cívico, pela recusa em corrigir os erros apontados, alguns até de certa gravidade, totalmente condenáveis numa entidade que empresta uma aura de autoridade àquilo que sob a sua chancela se publica.
José Pedro Machado para editar os seus Dicionários dispunha apenas da sua cabeça, do seu honesto estudo, do papel, do lápis, da borracha e do impulso da sua capacidade de trabalho, sem computadores, sem CD, sem quaisquer outros meios potenciadores do seu empenho.
E, assim mesmo, ao longo dos anos da sua longa vida, foi dando à estampa imensos trabalhos de lexicologia e de lexicografia, sem gozar de dispensas laborais, de licenças ou de outras facilidades.
Se isto não merece distinção, não sei então o que o mereça. Por isso mesmo, remetemos em 2006 uma exposição à Chancelaria das Ordens Honoríficas, na Presidência da República, com vista à concessão de uma condecoração condigna, ainda que a título póstumo, no 10 de Junho, Dia de Camões, de Portugal e das Comunidades Portuguesas, que teria de ser superior àquela que ele recebeu em 1996, o Grau de Grande Oficial da Ordem da Instrução Pública.
Existem vários casos precedentes, em que foram contemplados cidadãos com menos obra e sem o equivalente aprumo cívico de JPM. Não desistiremos de lutar por este objectivo. Testaremos de novo a solidez dos critérios das autoridades.
Para quem não tenha lido os anteriores artigos que aqui coloquei sobre a figura deste egrégio cidadão, figura de português impoluto, transcrevo a seguir a nota bio-bibiográfica correspondente, que, na sequência da sua morte, então elaborei.
AV_Lisboa, 06 de Janeiro de 2007
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Não somos assim tão pródigos em valores humanos que nos possamos dar ao luxo de deixar passar despercebido um vulto intelectual e cívico desta categoria. Seríamos indignos do seu exemplo, se tal acontecesse.
Por minha parte, continuarei este combate pela difusão e pelo reconhecimento da obra deste eminente intelectual português, paradigma de comportamento cívico a quaisquer títulos invocados, caso ainda mais extraordinário nos tempos frouxos, apagados de virtude em que vivemos.
A cerimónia singela que a Livraria Portugal organizou, na passada quinta-feira ao fim da tarde, com a modesta concorrência registada, quadra, no entanto, com o perfil ético do homenageado, superiormente frugal, espartano, como sempre o conhecemos, impassível e perseverante ante os mais variados óbices e dificuldades que se lhe ofereciam no caminho.
Se se tratasse da apresentação de uma qualquer futilidade mundana, teríamos provavelmente centenas de pessoas amontoadas até à porta do estabelecimento, como se tem visto ultimamente em tantos designados eventos que apenas anunciam escândalos ou perversidades.
Ainda assim, acorreram suficientes pessoas conhecedoras da figura do insigne académico homenageado, apreciadoras do seu trabalho e do seu exemplo cívico, que mostraram interesse e sensibilidade pelos valores intelectuais e éticos que ele exuberantemente demonstrou na sua longa prática quotidiana.
Ficámos até muito congratulados por termos sabido que a Academia Portuguesa da História pondera a hipótese de reeditar a tradução directa do árabe para a nossa língua do Alcorão feita por José Pedro Machado, obra singular e absolutamente pioneira em Portugal, tanto quanto julgo saber, em que este académico trabalhou afincadamente durante cerca de 15 anos até a dar à estampa em 1979.
Na altura, a obra volumosa, de mais de 750 páginas, que JPM, arabista emérito, enriqueceu com numerosas notas explicativas, em que ficou bem patente a sua vasta erudição filológica, nas suas diversas disciplinas complementares, foi editada sob o patrocínio da Junta de Investigações Científicas do Ultramar, com um prefácio do Dr. Suleiman Vali Mamede, então presidente da Comunidade Islâmica Portuguesa de Lisboa.
Rapidamente esta obra se esgotou, só estando hoje disponível em boas bibliotecas ou porventura nas estantes de um Alfarrabista mais criterioso. A Academia Portuguesa da História prestaria um serviço de inestimável valor cultural a toda a Comunidade se promovesse a reedição deste notável trabalho de José Pedro Machado.
O mesmo se poderia dizer de outras obras da autoria ou da coordenação de JPM, que se encontram há muito inacessíveis ao público leitor. Entre elas citarei o chamado Dicionário de Morais, em 12 grossos volumes, que ele ainda coordenou, na sua 10ª edição, de 1959, tendo contado também com a colaboração de Augusto Moreno e Cardoso Júnior.
Nesta portentosa obra está feita a mais abundante cópia de abonações de vocábulos usados por cultores exímios da Língua, de todas as épocas consideradas, e não quase só dos últimos dois séculos, como sucedeu com as abonações do recente Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa, saído em 2001, na Editorial Verbo.
Este Dicionário da Academia, que havia parado na letra A, no longínquo ano de 1793, viu finalmente a luz do dia, na sua edição completa de 2001. Mas para isso teve de contar com largos subsídios financeiros da Fundação Calouste Gulbenkian, com dezenas de professores do Ensino Secundário dispensados a tempo inteiro pelo Ministério da Educação, bem como beneficiou da utilização da tecnologia mais recente adequada à elaboração deste tipo de obras.
Apesar de tantos meios e da reputada orientação do Prof. Dr. Malaca Casteleiro, Presidente do Instituto de Lexicologia e Lexicografia da Academia das Ciências, este importante Dicionário, pela sua capacidade caucionadora, saiu com inexplicáveis omissões, como por ex. : asinha/depressa, ao mesmo tempo que acolhia vocábulos, cujo uso sempre fora repudiado por professores de todos os graus de Ensino, como o célebre bué e outros – muitos – vocábulos espúrios ou chulismos de mau gosto, que apenas caberiam num dicionário de calão.
Várias pessoas chamaram a atenção para os incompreensíveis critérios do Prof. Malaca, entre eles, Vasco Graça Moura, que, com vários exemplos, demonstrou as incongruências dos mesmos presentes no tão conceituado dicionário.
Se tais deficiências não forem eliminadas em futuras edições, estaremos perante um caso de esbanjamento de recursos e de falta de sentido cívico, pela recusa em corrigir os erros apontados, alguns até de certa gravidade, totalmente condenáveis numa entidade que empresta uma aura de autoridade àquilo que sob a sua chancela se publica.
José Pedro Machado para editar os seus Dicionários dispunha apenas da sua cabeça, do seu honesto estudo, do papel, do lápis, da borracha e do impulso da sua capacidade de trabalho, sem computadores, sem CD, sem quaisquer outros meios potenciadores do seu empenho.
E, assim mesmo, ao longo dos anos da sua longa vida, foi dando à estampa imensos trabalhos de lexicologia e de lexicografia, sem gozar de dispensas laborais, de licenças ou de outras facilidades.
Se isto não merece distinção, não sei então o que o mereça. Por isso mesmo, remetemos em 2006 uma exposição à Chancelaria das Ordens Honoríficas, na Presidência da República, com vista à concessão de uma condecoração condigna, ainda que a título póstumo, no 10 de Junho, Dia de Camões, de Portugal e das Comunidades Portuguesas, que teria de ser superior àquela que ele recebeu em 1996, o Grau de Grande Oficial da Ordem da Instrução Pública.
Existem vários casos precedentes, em que foram contemplados cidadãos com menos obra e sem o equivalente aprumo cívico de JPM. Não desistiremos de lutar por este objectivo. Testaremos de novo a solidez dos critérios das autoridades.
Para quem não tenha lido os anteriores artigos que aqui coloquei sobre a figura deste egrégio cidadão, figura de português impoluto, transcrevo a seguir a nota bio-bibiográfica correspondente, que, na sequência da sua morte, então elaborei.
AV_Lisboa, 06 de Janeiro de 2007
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José Pedro Machado
( N. em Faro a 08-11-1914 – F. em Lisboa a 26-07-2005 )
- Breve nota biográfica
José Pedro Machado nasceu no Algarve, na cidade de Faro, a 8 de Novembro de 1914. Veio ainda criança para Lisboa, acompanhando a deslocação do pai, militar da Marinha de Guerra Portuguesa. Aqui viveu a quase totalidade da sua existência, como filho adoptivo e dedicado da cidade, sem nunca esquecer, todavia, a sua amorosa província natal, à qual prodigalizou sobejas provas de carinho e devoção, de resto, profusamente correspondidas.
Habitou primeiro na zona de Alcântara - Santo Amaro, na Rua Bocage, actual Rua Amadeu de Sousa Cardoso, perto da Rua Luís de Camões, facto curioso, não despiciendo, como se verá adiante, quando se fizer referência às suas áreas predilectas de investigação filológica e literária.
Morou também na Lapa, na Rua S. Francisco de Borja, durante alguns anos, até se fixar mais tarde na encosta de uma das mais típicas e encantadoras colinas de Lisboa, junto à Graça, na Rua Leite de Vasconcelos, outro nome famoso e influente na sua vida profissional e académica.
Morou também na Lapa, na Rua S. Francisco de Borja, durante alguns anos, até se fixar mais tarde na encosta de uma das mais típicas e encantadoras colinas de Lisboa, junto à Graça, na Rua Leite de Vasconcelos, outro nome famoso e influente na sua vida profissional e académica.
Frequentou os Liceus Pedro Nunes, Passos Manuel e D. João de Castro, estabelecimentos de ensino de notáveis pergaminhos, na formação de gerações e gerações de portugueses, em que contactou com alguns excelentes Professores, que cedo lhe despertaram qualidades e vocações invulgares, proporcionando-lhe valiosa preparação para a entrada na Universidade.
De entre esses Mestres, deve salientar-se o nome do Professor Marques Braga, a quem JPM, ao longo da vida e em vários escritos seus, se há-de sempre referir com elevada estima e gratidão, pela benéfica influência que exerceu na sua futura vida profissional e académica.
Estudou depois na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, onde se licenciou, em Filologia Românica, em 1938, com altas classificações, tendo logo revelado clara vocação de Filólogo, nas primeiras investigações aí desenvolvidas.
Em particular, essa vocação focalizou-se no estudo do Árabe, em que foi discípulo dilecto do insigne Mestre David Lopes, Professor que, na Universidade Portuguesa, se notabilizou como pioneiro e grande impulsionador dos estudos da Língua e Cultura Árabes. A tese de licenciatura de JPM – Comentários a Alguns Arabismos do Dicionário de Nascentes – incidiu, aliás, nesse tema, ainda hoje pouco cultivado em Portugal.
Destinava-se, como tudo indicava, a uma promissora carreira universitária, quando se iniciou como Assistente, na sua Faculdade de Letras, tendo chegado a estar nomeado, por parecer de dois dos mais ilustres Professores da Faculdade, David Lopes e Leite de Vasconcelos, para Leitor de Português, na Universidade de Argel, onde certamente aprofundaria – ainda mais – o seu gosto e o seu conhecimento da Língua e Cultura Árabes. Desafortunadamente, o desencadear da Segunda Guerra Mundial, nos primeiros dias de Setembro de 1939, acabaria por impossibilitar tão justificada nomeação.
Foi também naquela Faculdade que conheceu a que viria a ser sua mulher, a Professora Doutora Elza Paxeco, com ele co-autora da muito citada edição comentada do Cancioneiro da Biblioteca Nacional, antigo Colocci-Brancuti e, ela própria, pessoa de notável capacidade intelectual, tendo sido a primeira senhora doutorada em Letras pela Universidade de Lisboa (1938) e autora de diversos trabalhos de investigação que lhe granjearam igualmente merecida reputação, entre eles e além do já citado, o intitulado «Estudos em Três Línguas», Lisboa, 1945, obra hoje rara, só disponível em boas Bibliotecas ou em algum Alfarrabista criterioso.
Foi também naquela Faculdade que conheceu a que viria a ser sua mulher, a Professora Doutora Elza Paxeco, com ele co-autora da muito citada edição comentada do Cancioneiro da Biblioteca Nacional, antigo Colocci-Brancuti e, ela própria, pessoa de notável capacidade intelectual, tendo sido a primeira senhora doutorada em Letras pela Universidade de Lisboa (1938) e autora de diversos trabalhos de investigação que lhe granjearam igualmente merecida reputação, entre eles e além do já citado, o intitulado «Estudos em Três Línguas», Lisboa, 1945, obra hoje rara, só disponível em boas Bibliotecas ou em algum Alfarrabista criterioso.
Foi afastada da Universidade, em consequência de rivalidades, invejas e intrigas, conhecidas maleitas, mesquinhas mas deletérias, que costumam assolar os agitados bastidores universitários, comprovado mal de todos os tempos e de todas as Academias. Algo de grave se terá então passado, para ter levado Pedro Machado, em solidariedade, a demitir-se das suas funções de Assistente e, em alternativa, a ter preferido um lugar mais modesto, mas mais seguro, de Professor Efectivo do Ensino Secundário, naqueles espartanos tempos do começo da Segunda Guerra Mundial.
Assim a Universidade Portuguesa se privou de uma alta e certa vocação de investigador, designadamente, nas áreas da Filologia, da Literatura e da História, áreas em que, não obstante, ao longo da sua dilatada vida, Pedro Machado muito trabalhou, em condições menos adequadas, é certo, mas sempre com bons resultados, tanto mais brilhantes, quanto mais precárias ou menos favoráveis as condições de trabalho se lhe apresentaram.
Logo que licenciado, começou José Pedro Machado a colaborar em revistas especializadas de Filologia, a convite de Mestres que lhe reconheciam a capacidade intelectual, a cuidada preparação e a integridade de carácter, condições difíceis de encontrar reunidas, em plano elevado, em qualquer comum mortal, em qualquer época.
Na década de 40, escreve e edita vários volumes dedicados ao estudo da Língua Portuguesa, mas é em 1952 que surge a sua primeira grande obra, de autêntico Filólogo, o Dicionário Etimológico da LP, hoje com cinco volumes, que tem conhecido várias reedições, confirmando o interesse do vasto público por tema pouco estudado entre nós. Basta assinalar que, desde essa data, embora não sendo um trabalho perfeitíssimo, como há quem aponte, ainda nenhum outro português ousou publicar livro idêntico, ao contrário do que tem sucedido com os tradicionais dicionários generalistas da Língua Portuguesa.
No Brasil, foram também raros os que se aventuraram a tal empreendimento, embora, neste domínio, se deva reconhecer o grande mérito do trabalho pioneiro de Antenor Nascentes, de que Pedro Machado largamente aproveitou, no convívio intelectual e pessoal que com ele manteve ao longo da vida.
Em complemento ao Dicionário Etimológico de José Pedro Machado, deve citar-se o Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, em três volumes, obra importante, num campo em que, analogamente, não tem havido emulação entre nós. Trata-se de um tipo de obras que exige longa e esmerada preparação, em várias disciplinas complementares do saber filológico, da Língua à História, à Literatura, à Geografia, à Antropologia, etc., a par de uma fina perspicácia intelectual, capaz de desenredar termos e conceitos, por regra, envoltos em polémicas ou disputas, em que se ganham ou destroem reputações.
Lexicógrafo de largo fôlego, José Pedro Machado elaborou ou coordenou, ao longo de décadas, muitos Dicionários afamados da Língua Portuguesa, desde o mui conceituado Morais, um dos primeiros dicionários da Língua Portuguesa, continuamente actualizado desde 1789, da autoria de um brasileiro, António de Morais Silva, bacharel em Direito, pela Universidade de Coimbra, até ao Grande Dicionário da Sociedade da Língua Portuguesa, numa prova cabal da sua competência, sempre exercida com inquebrantável dedicação, arrostando com carências, dificuldades e até incompreensões diversas.
Outro notável trabalho seu veio a ser a tradução directa do Árabe, para a nossa Língua, do livro sagrado dos muçulmanos, o Alcorão, cujas profusas e minuciosas notas, pejadas de esclarecimentos, no domínio da História, da Língua, da Geografia e até da Religião, enriqueceram extraordinariamente a obra, inserindo-a no seu contexto cultural e histórico, para bem se compreenderem o seu significado e a sua importância.
Outro notável trabalho seu veio a ser a tradução directa do Árabe, para a nossa Língua, do livro sagrado dos muçulmanos, o Alcorão, cujas profusas e minuciosas notas, pejadas de esclarecimentos, no domínio da História, da Língua, da Geografia e até da Religião, enriqueceram extraordinariamente a obra, inserindo-a no seu contexto cultural e histórico, para bem se compreenderem o seu significado e a sua importância.
Nestas obras mais significativas da sua larga produção intelectual está bem patente toda a sua vasta e sólida formação, todo o seu ânimo empreendedor, que o levaram a meter ombros a trabalhos espinhosos, exigentes, arrojados e, invariavelmente, de escassa publicidade e diminuto prémio material.
Mencione-se também a sua continuada ligação à Livraria Portugal, por via da sua íntima amizade com um dos antigos proprietários e fundadores, Henrique Pinto, já falecido, igualmente espírito empreendedor, com apurado sentido cultural, no exercício da sua nobre função de livreiro, comprovado até na forma como soube atrair e conservar a cooperação de Pedro Machado no prestimoso Boletim dos Serviços Bibliográficos da Livraria, a que ele galhardamente emprestou toda a pujança do seu saber, numa escrita sóbria, mas rigorosa, elegante, na sua aparente simplicidade, cumprida com escrupulosa regularidade.
Aqui, mensalmente, desde a década de 50 do século passado, Pedro Machado publicava artigos de oportuna intervenção cultural, sobre múltiplos temas da Cultura Portuguesa, sobretudo, que, depois, a Livraria, fundada em 1941, reunia e editava em livro, com o título de «Factos, Pessoas e Livros», ao fim de cada década, nos aniversários da Empresa.
Foram, assim, publicados 4 volumes, que cobrem aquela colaboração até ao fim de 1990, tendo o 4º volume saído em 1991, na comemoração do cinquentenário da Livraria, completando-se, com a edição do 5º e último volume, a publicação da série «Factos, Pessoas e Livros», com os artigos elaborados por José Pedro Machado desde 1991 até Maio de 2005.
Hábito muito antigo de Pedro Machado foi também o de escrever na imprensa nacional e regional, nomeadamente, no Diário de Lisboa, Diário Popular, A Capital, no Jornal de Sintra, no Correio do Sul, n‘O Algarve, no Jornal do Fundão, no Diário de Notícias, onde, aliás, manteve, durante anos sucessivos, na década de 90 e início da actual, uma coluna dedicada a questões da Língua Portuguesa, verdadeiro oásis no deserto de esquecimento a que este tema tem sido votado nos principais órgãos de Comunicação Social, nos últimos decénios.
Desavisadamente, deixou o Diário de Notícias extinguir aquele potente farol cultural, que derramava a luz do seu imenso saber, numa tribuna sempre muito procurada, com um enorme volume de correspondência, prova irrefutável do interesse que a sua coluna despertava nos muitos leitores do jornal.
Colaborou também com o eminente filólogo, Padre Raul Machado, na preparação das suas populares Charlas Linguísticas, transmitidas pela Radio-televisão Portuguesa (1960), que a Sociedade da Língua Portuguesa posteriormente reuniu e editou em livro com as lições aí expendidas.
Analogamente, escreveu em revistas nacionais e estrangeiras, como o Bulletin Hispanique ( Bordéus ), a Revista Filológica do Rio de Janeiro, o Boletim de Filologia de Lisboa, a Revista de Portugal, a revista Ocidente, o Boletim Mensal da Sociedade da Língua Portuguesa, a revista Língua e Cultura da mesma Sociedade, etc.
Sem pretender carregar esta breve nota biográfica, citarei ainda a participação de José Pedro Machado em obras colectivas de forte impacte cultural, como a Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, o Dicionário de História de Portugal, dirigido por Joel Serrão, a sua colaboração com a Comissão Científica da Academia das Ciências de Lisboa para o Acordo Ortográfico Luso-Brasileiro de 1945.
Mencionarei igualmente a enorme simpatia e o elevado apreço com que os estudiosos brasileiros da Língua Portuguesa sempre se referiam a José Pedro Machado, como pessoalmente pôde verificar o Professor Joaquim Veríssimo Serrão, Presidente da Academia Portuguesa da História, quando com ele viajou, em Agosto de 1959, até Salvador da Baía, no Brasil, onde se realizou o IV Encontro Internacional de Estudos Luso-Brasileiros.
No volume recentemente editado por aquela Academia, por ocasião da homenagem que, em sessão especial, a 17 de Novembro de 2004, lhe prestaram, na passagem do seu 90º aniversário, foram reunidos diversos trabalhos em honra de José Pedro Machado. Num deles, em comovido e comovente texto, Veríssimo Serrão relata, com pormenor e genuína afeição, vários episódios do seu convívio com JPM, como igualmente atesta as numerosas provas de carinho que lhe foram prodigamente manifestadas pelos seus pares brasileiros.
Em texto do próprio José Pedro Machado, num livro intitulado «Ensaios Literários e Linguísticos», publicado em 1995, pela Editorial Notícias, ficou, aliás, bem assinalada, em particular, a grande amizade que o unia ao Mestre brasileiro, Antenor Nascentes, Professor ilustre, profundo conhecedor da Língua Portuguesa e autor também de um notável Dicionário Etimológico, no qual JPM se inspirou e de cujo estudo fecundo muito beneficiou para posteriormente elaborar o seu.
Na sessão especial referida, no final de 2004, a Academia Portuguesa da História decidiu elevar José Pedro Machado à categoria de Académico de Mérito daquela Instituição, após ter sido sucessivamente seu Sócio Correspondente e Académico de Número, distinguindo desta forma a sua prolífica e valiosa colaboração, nas diversas actividades em que estatutariamente participou.
Já antes, em 1999, esta prestigiosa Academia tinha proposto, ao então Ministro da Cultura, Manuel Maria Carrilho, a atribuição de uma medalha de Mérito Cultural a JPM, que aquele favoravelmente despachou. Em 14-06-1996, fora também José Pedro Machado agraciado com o grau de Grande Oficial da Ordem da Instrução Pública.
Tendo sido membro de várias Instituições Culturais, como no fim do presente volume se indicará, em sucinto currículo que se agrega, possuía José Pedro Machado mais algumas distinções, mas ficou por prestar-lhe a mais significativa de todas, a da sua condecoração pública, no 10 de Junho, Dia de Portugal, de Camões, e das Comunidades, entidades a que ele tanto trabalho e saber dedicou ao longo da sua extensa e multifacetada vida. Camões e Portugal são temas predilectos, constantemente honrados na produção literária de José Pedro Machado.
Tendo sido membro de várias Instituições Culturais, como no fim do presente volume se indicará, em sucinto currículo que se agrega, possuía José Pedro Machado mais algumas distinções, mas ficou por prestar-lhe a mais significativa de todas, a da sua condecoração pública, no 10 de Junho, Dia de Portugal, de Camões, e das Comunidades, entidades a que ele tanto trabalho e saber dedicou ao longo da sua extensa e multifacetada vida. Camões e Portugal são temas predilectos, constantemente honrados na produção literária de José Pedro Machado.
Na verdade, o seu nome, ao lado da maioria dos já consagrados nesta data, nestes últimos 31 anos de Liberdade e Democracia, ressalta como uma evidência da justiça que ficou por prestar-lhe em vida.
Cumpre reparar, ainda que a título póstumo, esta lamentável falta do Portugal democrático, para com quem sempre o serviu com elevação, competência e dignidade, no Espírito, como na Ética, num comportamento cívico a todos os títulos irrepreensível.
Quero acreditar que ainda seja possível corrigi-la.
Honremos, pois, nessa imperiosa correcção, a digna memória de José Pedro Machado.
Um seu antigo aluno, amigo de sempre, profundamente grato do seu frutuoso magistério e do seu amável convívio.
Um seu antigo aluno, amigo de sempre, profundamente grato do seu frutuoso magistério e do seu amável convívio.
AV_Lisboa, 18 de Outubro de 2005
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Breve nota do Currículo e da Bibliografia do Dr. José Pedro Machado bem como das Agremiações Culturais de que era Membro.
( N. em Faro a 08-11-1914 – F. em Lisboa a 26-07-2005 )
Breve nota do Currículo e da Bibliografia do Dr. José Pedro Machado bem como das Agremiações Culturais de que era Membro.
( N. em Faro a 08-11-1914 – F. em Lisboa a 26-07-2005 )
Currículo abreviado :
- Licenciatura em Filologia Românica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, em 1938.
- Curso de Ciências Pedagógicas, pela Universidade de Coimbra, em 1940.
- Membro da Comissão de Redacção do Vocabulário e do Dicionário da Academia das Ciências de Lisboa (1938-1940).
- Assistente da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1942-43.
- Professor Efectivo do Ensino Técnico, na Escola Industrial Afonso Domingues, mais tarde Escola Secundária Afonso Domingues.
- Director em exercício da Escola Industrial Afonso Domingues.
Membro das seguintes Agremiações Culturais :
- Academia Portuguesa da História.
- Sociedade Euclides da Cunha ( Paraná ).
- Instituto Histórico e Geográfico de S. Paulo.
- Academia Brasileira de Filologia.
- Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.
- Academia Nacional de la Historia ( Venezuela ).
- Real Academia de la Historia ( Espanha ).
- Academia Real Sueca de Belas-Artes, História e Antiguidades.
- Academia de Marinha ( Lisboa ).
- Sócio de Honra da Sociedade da Língua Portuguesa.
Bibliografia Principal (não exaustiva ) :
- Alguns Vocábulos de Origem Arábica, 1939.
- Contemplação de S. Bernardo Segundo as Seis Horas Canónicas do Dia ( Texto do séc. XV).
- Comentários a Alguns Arabismos do Dicionário de Nascentes, 1940.
- Curiosidades Filológicas, 1940.
- Sintra Muçulmana, 1940.
- Évora Muçulmana, 1940.
- Gonçalves Viana, 1940.
- O Português do Brasil, 1942
- Elementos Hispânicos do Vocabulário Latino, 1943.
- Descobrimentos Portugueses, colaboração na monumental edição do Dr. João Martins da Silva Marques, seu Professor na Universidade, 1944.
- As Origens do Português, 1945.
- Breve História da Linguística, 1945.
- Origem da Língua Portuguesa de Duarte Nunes de Leão, 1945.
- Bases da Nova Ortografia, 1946.
- Cancioneiro de Évora, 1951.
- Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, 1952.
- Os Estudos Arábicos em Portugal, 1954.
- Gramática da Língua Portuguesa de João de Barros, 1957.
- Influência Arábica no Vocabulário Português, 1958.
- Grande Dicionário da Língua Portuguesa de António de Morais Silva, em 12 volumes, 10.ª edição, revista, corrigida, muito aumentada e actualizada, em colaboração com Augusto Moreno e Cardoso Júnior, 1959.
- Dicionário do Estudante, 1960.
- Os Mais Antigos Arabismos da Língua Portuguesa, 1961.
- Glossário de Termos Filológicos incluído na obra Estudos de Filologia Portuguesa do Doutor J. Leite de Vasconcellos, editado na Colecção Brasileira de Filologia Portuguesa, Livros de Portugal, Rio de Janeiro, 1961.
- Notas de Toponímia Portuguesa, 1962.
- Notas Etimológicas, 1963.
- Edição Comentada do Cancioneiro da Biblioteca Nacional, em oito volumes, em parceria com sua esposa, Elza Paxeco Machado, 1947-1964.
- Nótulas de Sintaxe Portuguesa, 1965.
- Elementos Arábicos no Vocabulário Técnico dos «Colóquios» de Garcia d’Orta, 1963.
- Cartas Dirigidas a David Lopes, coordenação e notas, 1967.
- Topónimos Estrangeiros em Fernão Lopes, 1967.
- Acerca do Nome Árabe de Lisboa em colaboração com Elza Paxeco, 1968.
- A Viagem de Vasco da Gama, de parceria com Viriato Campos, 1968.
- Ensaio sobre Faro no Tempo dos Mouros, 1971.
- Dicionários – Alguns dos seus Problemas, 1971.
- Dispersos de Carolina Michaëlis de Vasconcelos, em 3 volumes, 1969-1972.
- Tradução directa do Árabe do Alcorão, edição crítica, profusamente anotada e comentada, 1979, edição da Junta de Investigações Científicas do Ultramar.
- Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, 1981.
- Notas Camonianas, 1982.
- Grande Dicionário da Língua Portuguesa, 1984.
- Factos, Pessoas e Livros, 4 volumes, colectânea de artigos publicados no Boletim dos Serviços Bibliográficos da Livraria Portugal, desde 1953 a 1990. A publicação do 5º volume, contendo os artigos elaborados de 1991 até Maio de 2005, encontra-se no prelo.
- Vocabulário Português de Origem Árabe, Editorial Notícias, 1993.
- Ensaios Arábico-Portugueses, Editorial Notícias, 1994.
- Ensaios Literários e Linguísticos, Editorial Notícias, 1995.
- Palavras a Propósito de Palavras – Notas Lexicais, Editorial Notícias, 1995.
- Estrangeirismos na Língua Portuguesa, Editorial Notícias, 1996.
- Ensaios Histórico-Linguísticos, Editorial Notícias, 1996.
- O Grande Livro dos Provérbios, 1998.
- Breve Dicionário Enciclopédico da Língua Portuguesa, Dom Quixote, 1999.
- Grande Vocabulário da Língua Portuguesa, Âncora, 2000.
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- Licenciatura em Filologia Românica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, em 1938.
- Curso de Ciências Pedagógicas, pela Universidade de Coimbra, em 1940.
- Membro da Comissão de Redacção do Vocabulário e do Dicionário da Academia das Ciências de Lisboa (1938-1940).
- Assistente da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1942-43.
- Professor Efectivo do Ensino Técnico, na Escola Industrial Afonso Domingues, mais tarde Escola Secundária Afonso Domingues.
- Director em exercício da Escola Industrial Afonso Domingues.
Membro das seguintes Agremiações Culturais :
- Academia Portuguesa da História.
- Sociedade Euclides da Cunha ( Paraná ).
- Instituto Histórico e Geográfico de S. Paulo.
- Academia Brasileira de Filologia.
- Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.
- Academia Nacional de la Historia ( Venezuela ).
- Real Academia de la Historia ( Espanha ).
- Academia Real Sueca de Belas-Artes, História e Antiguidades.
- Academia de Marinha ( Lisboa ).
- Sócio de Honra da Sociedade da Língua Portuguesa.
Bibliografia Principal (não exaustiva ) :
- Alguns Vocábulos de Origem Arábica, 1939.
- Contemplação de S. Bernardo Segundo as Seis Horas Canónicas do Dia ( Texto do séc. XV).
- Comentários a Alguns Arabismos do Dicionário de Nascentes, 1940.
- Curiosidades Filológicas, 1940.
- Sintra Muçulmana, 1940.
- Évora Muçulmana, 1940.
- Gonçalves Viana, 1940.
- O Português do Brasil, 1942
- Elementos Hispânicos do Vocabulário Latino, 1943.
- Descobrimentos Portugueses, colaboração na monumental edição do Dr. João Martins da Silva Marques, seu Professor na Universidade, 1944.
- As Origens do Português, 1945.
- Breve História da Linguística, 1945.
- Origem da Língua Portuguesa de Duarte Nunes de Leão, 1945.
- Bases da Nova Ortografia, 1946.
- Cancioneiro de Évora, 1951.
- Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, 1952.
- Os Estudos Arábicos em Portugal, 1954.
- Gramática da Língua Portuguesa de João de Barros, 1957.
- Influência Arábica no Vocabulário Português, 1958.
- Grande Dicionário da Língua Portuguesa de António de Morais Silva, em 12 volumes, 10.ª edição, revista, corrigida, muito aumentada e actualizada, em colaboração com Augusto Moreno e Cardoso Júnior, 1959.
- Dicionário do Estudante, 1960.
- Os Mais Antigos Arabismos da Língua Portuguesa, 1961.
- Glossário de Termos Filológicos incluído na obra Estudos de Filologia Portuguesa do Doutor J. Leite de Vasconcellos, editado na Colecção Brasileira de Filologia Portuguesa, Livros de Portugal, Rio de Janeiro, 1961.
- Notas de Toponímia Portuguesa, 1962.
- Notas Etimológicas, 1963.
- Edição Comentada do Cancioneiro da Biblioteca Nacional, em oito volumes, em parceria com sua esposa, Elza Paxeco Machado, 1947-1964.
- Nótulas de Sintaxe Portuguesa, 1965.
- Elementos Arábicos no Vocabulário Técnico dos «Colóquios» de Garcia d’Orta, 1963.
- Cartas Dirigidas a David Lopes, coordenação e notas, 1967.
- Topónimos Estrangeiros em Fernão Lopes, 1967.
- Acerca do Nome Árabe de Lisboa em colaboração com Elza Paxeco, 1968.
- A Viagem de Vasco da Gama, de parceria com Viriato Campos, 1968.
- Ensaio sobre Faro no Tempo dos Mouros, 1971.
- Dicionários – Alguns dos seus Problemas, 1971.
- Dispersos de Carolina Michaëlis de Vasconcelos, em 3 volumes, 1969-1972.
- Tradução directa do Árabe do Alcorão, edição crítica, profusamente anotada e comentada, 1979, edição da Junta de Investigações Científicas do Ultramar.
- Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, 1981.
- Notas Camonianas, 1982.
- Grande Dicionário da Língua Portuguesa, 1984.
- Factos, Pessoas e Livros, 4 volumes, colectânea de artigos publicados no Boletim dos Serviços Bibliográficos da Livraria Portugal, desde 1953 a 1990. A publicação do 5º volume, contendo os artigos elaborados de 1991 até Maio de 2005, encontra-se no prelo.
- Vocabulário Português de Origem Árabe, Editorial Notícias, 1993.
- Ensaios Arábico-Portugueses, Editorial Notícias, 1994.
- Ensaios Literários e Linguísticos, Editorial Notícias, 1995.
- Palavras a Propósito de Palavras – Notas Lexicais, Editorial Notícias, 1995.
- Estrangeirismos na Língua Portuguesa, Editorial Notícias, 1996.
- Ensaios Histórico-Linguísticos, Editorial Notícias, 1996.
- O Grande Livro dos Provérbios, 1998.
- Breve Dicionário Enciclopédico da Língua Portuguesa, Dom Quixote, 1999.
- Grande Vocabulário da Língua Portuguesa, Âncora, 2000.
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4.1.07
A Propósito da Edição de Mais Um Livro do Dr. José Pedro Machado
Transcrevo a seguir a alocução hoje proferida na Livraria Portugal, pelo autor deste blogue, a propósito da edição do 5º volume da obra «Factos, Pessoas e Livros».
Homenagem da Livraria Portugal e da Associação dos Antigos Alunos da Escola Industrial Afonso Domingues ao Dr. José Pedro Machado, na apresentação do 5º volume da obra «Factos, Pessoas e Livros», em 4 de Janeiro de 2007, na sede da Livraria, em Lisboa, na Rua do Carmo, 70.
A razão que nos traz aqui hoje é simples, mas muito cara de todos : evocar o nome e a obra do Dr. José Pedro Machado, insigne figura de Professor e Académico, Cidadão de méritos invulgares, que nós tivemos o privilégio de conhecer e apreciar, nas diversas actividades a que ele se entregou no decurso da sua vida, felizmente dilatada e notavelmente fecunda.
Como antigo discípulo de José Pedro Machado e como membro da Associação dos Antigos Alunos da Escola Industrial Afonso Domingues, aqui igualmente representada por elementos da sua Direcção, sinto-me naturalmente muito honrado em poder associar-me a esta singela homenagem, com que a Livraria Portugal e a nossa Associação quiseram assinalar a publicação do 5º volume da obra «Factos, Pessoas e Livros».
Aqui mesmo, nesta casa, que foi também a de José Pedro Machado durante mais de cinco décadas de contínua e profícua colaboração, em boa hora solicitada por Henrique Pinto, fundador e grande impulsionador da Livraria Portugal, já se fizeram homenagens a José Pedro Machado, ilustradas por comunicações de nomes relevantes da Cultura Portuguesa.
Basta que nos lembremos da que assinalou os 40 anos da vida intelectual pública de JPM, em 1979, de que nos ficaram textos brilhantes, com elogios inteiramente merecidos às múltiplas actividades culturais a que JPM se dedicava, praticamente desde que saiu da Universidade ou mesmo antes disso, desde quando era ainda Estudante, aplicado sempre, e já com alguns créditos conquistados entre os seus Mestres.
Algumas das peças alusivas a essa homenagem, tive a oportunidade de as ler recentemente, por gentileza da Livraria Portugal, na pessoa do nosso comum amigo, o Sr. Joaquim, que as procurou no arquivo da Livraria e depois mas facultou.
Lá estão depoimentos importantes, sinceros, verdadeiros e de fino recorte literário, exarados por académicos eminentes das nossas mais antigas Academias : a da História e a das Ciências de Lisboa. De entre esses depoimentos, permitam-me, no entanto, que destaque o do Dr. Alberto Iria, confrade e comprovinciano de José Pedro Machado, pelo exaustivo levantamento que ele fez da bibliografia do homenageado, já então numerosa, e que muito haveria ainda de crescer.
Quando, há cerca de ano e meio, comecei a coligir elementos para a minha modesta nota bio-bibliográfica de JPM, infelizmente, desconhecia esse trabalho do Dr. Alberto Iria e não pude aproveitar elementos importantes que nele se encontram. Socorri-me então dos registos incluídos nos primeiros volumes da obra de JPM «Factos, Pessoas e Livros» e de mais alguns elementos dispersos que logrei apurar, quer da bibliografia, quer da biografia de JPM, como sabem, estes últimos são notoriamente escassos, até pela proverbial modéstia de JPM que raramente o levava a falar de si.
Curiosamente, só em alguns dos seus últimos livros vindos a público pela feliz iniciativa da Editorial Notícias, ligada ao que julgo, ao Diário de Notícias, jornal em que JPM manteve durante vários anos, já na década de 90, interessantíssima coluna sobre a sua dama excelsa, a Língua Portuguesa, começaram a aparecer certos elementos biográficos, quando JPM descrevia episódios em que intervieram figuras relevantes da Cultura Portuguesa e Brasileira com quem ele se relacionara, como discípulo, depois colega e confrade.
Em dois desses últimos livros editados pela Editorial Notícias : Ensaios Literários e Linguísticos, de 1995 e Ensaios Histórico-Linguísticos, de 1996, surgem finalmente referências a factos da vida privada de JPM, ainda assim parcas e só pela relação que tiveram com outros factos que ele reputou interessantes ou com pessoas que lhe mereceram particular consideração.
Em Maio de 2005, quando decidi escrever o meu primeiro artigo sobre JPM, na sequência de uma carta que ele me dirigira, no âmbito da nossa velha amizade, como que pressentira o perigo de um desfecho trágico, quer pela sua avançada idade, quer pelas suas mais que habituais lamentações e queixumes de falta de saúde e de energia para continuar a corresponder a diversas solicitações.
Nessa altura, já restringira os seus compromissos à elaboração do artigo mensal para o Boletim dos Serviços Bibliográficos da Livraria Portugal, que escrupulosamente quereria manter, até como forma de continuar a assumir a sua participação cívica, ainda que dentro das reais possibilidades dos seus 90 anos. Com efeito, o último artigo que encerra este agora saído 5º volume de «Factos, Pessoas e Livros» respeita a Maio de 2005, ou seja, a dois meses antes da data da sua morte.
Pode assim dizer-se que JPM trabalhou até quase aos derradeiros dias da sua vida, uma vida extensa e rica de contributos para a Cultura Portuguesa, como já referi e como, modestamente, procurei salientar na nota bio-bibliográfica que redigi há mais de um ano, depois de ter aguardado da nossa Comunicação Social, algo de mais completo e preciso do que as magras e inexactas notícias que nela pude colher após a sua morte.
Que eu saiba, com as excepções do Centro Nacional de Cultura, que publicou uma nota breve mas equilibrada e correcta nos dados referentes a JPM, e da Academia Portuguesa da História, que, em 11 de Outubro de 2006, realizou uma sessão especial em sua memória, depois de, já no final de 2004, lhe haver promovido significativa homenagem, pela passagem do seu 90º aniversário, tudo o resto, Instituições e Comunicação Social, se destacou pela omissão, pela inexactidão e pela escassa relevância noticiosa com que o desaparecimento deste notável cidadão de dois séculos foi tratado.
Por desconhecimento da valia da pessoa em causa ou por desatenção cultural isso aconteceu. Pode e deve chocar-nos a brutalidade do facto, numa época em que tanto relevo vemos dar a ninharias, falsos valores e falsos ícones da nossa sociedade. Por isso mesmo, urge dar a conhecer aos Portugueses o nome, a obra e o nobre exemplo de cidadão de José Pedro Machado. Desde o seu falecimento que a Associação dos Antigos Alunos da Escola Industrial Afonso Domingues tem desenvolvido esforços nesse sentido.
Entretanto, ao terminar o Ano da Graça de 2006, eis que nos sobreveio uma comovente alegria : a de termos visto finalmente editado o tomo v da obra «Factos, Pessoas e Livros» do Prof. José Pedro Machado, com mais uma valiosa colectânea de artigos seus, escritos entre 1991 e Maio de 2005, ou seja, até dois meses antes da sua morte.
Para a sua publicação, um pequeno grupo de pessoas suas amigas se empenharam denodadamente, com destaque especial, para a direcção da AAAEIAD – Associação dos Antigos Alunos da Escola Industrial Afonso Domingues, que buscou e obteve os patrocínios necessários à edição do livro e para a Livraria Portugal, depositária dos originais do Professor, que sozinha havia editado os quatro anteriores volumes da obra.
Obra sem dúvida singular, no panorama livreiro do país, quer pelos temas nela tratados, quer, ainda mais, pelo longo período a que respeita, nela ficou assim reunida toda a colaboração que aquele preclaro Académico prestou no Boletim dos Serviços Bibliográficos da referida Livraria, desde o ano de 1953 até Maio de 2005.
Felizmente, todos os óbices foram removidos, incluindo os da revisão tipográfica, feita por esforços de amadores, no real sentido do termo, para suprir deficiências e anomalias numerosas, típicas destes trabalhos de edição. Mesmo assim, ainda algumas gralhas, poucas e sem influência na compreensão dos textos, passaram ao crivo desses diligentes esforços.
Serão naturalmente corrigidas em futuras edições, de acordo com aquele sagrado princípio em razão do qual se considera não haver outra solução para o erro senão a sua correcção, tão pronta quanto possível, ainda que, sobre o dito erro, possam aduzir-se as mais atendíveis justificações ou atenuantes. De resto, era esta mesma a doutrina preconizada e praticada pelo nosso saudoso Mestre.
Durante 52 anos, ininterruptamente, todos os meses, José Pedro Machado ali colocava, no referido Boletim, um artigo seu sobre Factos, Pessoas ou Livros que, no seu douto entender, mereceriam relevo, atenção ou leitura meditada, com realce para efemérides de nomes, factos ou obras de alto significado para a Cultura Portuguesa, embora também lá surgissem notas sobre temas da História ou das Letras Universais, da antiguidade oriental, da cultura greco-latina, mas também do Renascimento e do Romantismo, de outras épocas, correntes e estilos, da História à Literatura, à Filosofia, à Filologia, à Mitologia, à Toponímia, à Antroponímia, etc., etc.
Na verdade, ali se nos depara um conjunto vasto de temas que a sua enorme erudição lhe permitia tratar, com sínteses admiráveis, pela exactidão e pela concisão, duas características sempre perseguidas por quem pretende escrever com correcção e com clareza.
Neste último volume, até lá fui encontrar um artigo, de Junho de 1991, dedicado aos 200 anos do Sistema Métrico, empenho louvável de um grupo de sábios do tempo da Revolução Francesa, em que se incluíam os nomes prestigiados de Condorcet, Borda, Lagrange, Laplace e Monge, como refere JPM, no seu oportuno texto evocativo da efeméride.
Tudo ali era escrito numa prosa singela, escorreita, sem alarde de nenhuma espécie, porque este Mestre cultivava, em extremo, a simplicidade, a clareza e a objectividade, afinal atributos supremos da escrita que se quer universal, só acessíveis a poucos, aos que duramente persistem em laborar, sem desfalecimentos, nesta árdua faina das Letras, ainda que tenham nascido com inequívoca vocação literária.
Tudo isto JPM fazia, com escrupuloso zelo, a par dos múltiplos compromissos que assumia, sem beneficiar de bolsas, de licenças sabáticas ou de outras legítimas facilidades.
Cumprido este desiderato da edição do presente livro, falta-nos agora meter ombros à tarefa seguinte, que é a de reeditar os outros 4 volumes da obra, que só estarão disponíveis, eventualmente, em raras Bibliotecas ou em Alfarrabistas criteriosos.
Registe-se que estes livros eram e são distribuídos gratuitamente pela Livraria Portugal entre os seus mais antigos clientes e enviados a Estabelecimentos de Ensino, em Portugal e no Estrangeiro, como forma de difundir elementos da Cultura Portuguesa.
É, sem dúvida, numerosa a bibliografia de José Pedro Machado, de que já em vários artigos procurei dar conta. Permanecem, todavia, por recolher, identificar e agrupar muitos trabalhos que se acham dispersos por Revistas Culturais e por variados órgãos da imprensa nacional e regional.
Como Associação, de vocação também cultural, tudo continuaremos a fazer para divulgar o nome e a obra deste ínclito Português, de quem certamente se poderia dizer, com propriedade, que nada do que é humano lhe era estranho, à semelhança da sentença atribuída a Terêncio, famoso poeta latino do século II a.C.
Dos objectivos que nos propusemos alcançar, este, o da edição em livro dos últimos artigos escritos por JPM, é apenas o primeiro a ser atingido, porventura o mais fácil. Entre os restantes, figura o da atribuição do seu nome a uma rua de Lisboa, pedido já formulado à Câmara Municipal de Lisboa, aparentemente aceite, mas que aguarda despacho final.
Só pelos trabalhos que José Pedro Machado assinou sobre toponímia de Lisboa já se justificaria essa distinção, sem falar de outras obras igualmente relacionadas com Lisboa, cidade em que viveu mais de 80 anos como seu filho adoptivo.
Acalentamos ainda, como associação, outros objectivos que a seu tempo divulgaremos.
Em Faro, de onde JPM era natural, já este mencionado objectivo, embora por iniciativa de outrem, foi alcançado, figurando o seu nome honrado numa das artérias principais da capital algarvia. Outras localidades poderiam e deveriam fazer outro tanto, como Sintra, por exemplo, à qual JPM dedicou algum do seu vasto saber, em estudos e investigações que, a seu respeito, empreendeu.
Cumpre-nos prosseguir esta meritória campanha pela dignificação da memória de José Pedro Machado.
Como acima se salientou, num tempo tão escasso de verdadeiros talentos intelectuais e, sobretudo, cívicos, é justo que se procure perpetuar a memória de José Pedro Machado, para culto generalizado do seu alto exemplo de intelectual probo e cidadão sem mácula.
AV_Lisboa, 04 de Janeiro de 2007
PS : A todos os meus leitores, assíduos ou esporádicos, desejo que tenham passado um Natal Feliz, mais próximo da sua figura original, Jesus Cristo, do que da do comercial Pai Natal, com que a despudorada publicidade incessantemente nos pretende alienar, e que o Ano de 2007 possa trazer-nos a todos saúde e bons motivos de alegria, tanto no plano profissional, como no pessoal, no dos afectos, em particular, porque são estes que nos ajudam a viver com maior motivação e a ultrapassar as crises, as dificuldades, sempre presentes, na árdua labuta da vida.
Homenagem da Livraria Portugal e da Associação dos Antigos Alunos da Escola Industrial Afonso Domingues ao Dr. José Pedro Machado, na apresentação do 5º volume da obra «Factos, Pessoas e Livros», em 4 de Janeiro de 2007, na sede da Livraria, em Lisboa, na Rua do Carmo, 70.
A razão que nos traz aqui hoje é simples, mas muito cara de todos : evocar o nome e a obra do Dr. José Pedro Machado, insigne figura de Professor e Académico, Cidadão de méritos invulgares, que nós tivemos o privilégio de conhecer e apreciar, nas diversas actividades a que ele se entregou no decurso da sua vida, felizmente dilatada e notavelmente fecunda.
Como antigo discípulo de José Pedro Machado e como membro da Associação dos Antigos Alunos da Escola Industrial Afonso Domingues, aqui igualmente representada por elementos da sua Direcção, sinto-me naturalmente muito honrado em poder associar-me a esta singela homenagem, com que a Livraria Portugal e a nossa Associação quiseram assinalar a publicação do 5º volume da obra «Factos, Pessoas e Livros».
Aqui mesmo, nesta casa, que foi também a de José Pedro Machado durante mais de cinco décadas de contínua e profícua colaboração, em boa hora solicitada por Henrique Pinto, fundador e grande impulsionador da Livraria Portugal, já se fizeram homenagens a José Pedro Machado, ilustradas por comunicações de nomes relevantes da Cultura Portuguesa.
Basta que nos lembremos da que assinalou os 40 anos da vida intelectual pública de JPM, em 1979, de que nos ficaram textos brilhantes, com elogios inteiramente merecidos às múltiplas actividades culturais a que JPM se dedicava, praticamente desde que saiu da Universidade ou mesmo antes disso, desde quando era ainda Estudante, aplicado sempre, e já com alguns créditos conquistados entre os seus Mestres.
Algumas das peças alusivas a essa homenagem, tive a oportunidade de as ler recentemente, por gentileza da Livraria Portugal, na pessoa do nosso comum amigo, o Sr. Joaquim, que as procurou no arquivo da Livraria e depois mas facultou.
Lá estão depoimentos importantes, sinceros, verdadeiros e de fino recorte literário, exarados por académicos eminentes das nossas mais antigas Academias : a da História e a das Ciências de Lisboa. De entre esses depoimentos, permitam-me, no entanto, que destaque o do Dr. Alberto Iria, confrade e comprovinciano de José Pedro Machado, pelo exaustivo levantamento que ele fez da bibliografia do homenageado, já então numerosa, e que muito haveria ainda de crescer.
Quando, há cerca de ano e meio, comecei a coligir elementos para a minha modesta nota bio-bibliográfica de JPM, infelizmente, desconhecia esse trabalho do Dr. Alberto Iria e não pude aproveitar elementos importantes que nele se encontram. Socorri-me então dos registos incluídos nos primeiros volumes da obra de JPM «Factos, Pessoas e Livros» e de mais alguns elementos dispersos que logrei apurar, quer da bibliografia, quer da biografia de JPM, como sabem, estes últimos são notoriamente escassos, até pela proverbial modéstia de JPM que raramente o levava a falar de si.
Curiosamente, só em alguns dos seus últimos livros vindos a público pela feliz iniciativa da Editorial Notícias, ligada ao que julgo, ao Diário de Notícias, jornal em que JPM manteve durante vários anos, já na década de 90, interessantíssima coluna sobre a sua dama excelsa, a Língua Portuguesa, começaram a aparecer certos elementos biográficos, quando JPM descrevia episódios em que intervieram figuras relevantes da Cultura Portuguesa e Brasileira com quem ele se relacionara, como discípulo, depois colega e confrade.
Em dois desses últimos livros editados pela Editorial Notícias : Ensaios Literários e Linguísticos, de 1995 e Ensaios Histórico-Linguísticos, de 1996, surgem finalmente referências a factos da vida privada de JPM, ainda assim parcas e só pela relação que tiveram com outros factos que ele reputou interessantes ou com pessoas que lhe mereceram particular consideração.
Em Maio de 2005, quando decidi escrever o meu primeiro artigo sobre JPM, na sequência de uma carta que ele me dirigira, no âmbito da nossa velha amizade, como que pressentira o perigo de um desfecho trágico, quer pela sua avançada idade, quer pelas suas mais que habituais lamentações e queixumes de falta de saúde e de energia para continuar a corresponder a diversas solicitações.
Nessa altura, já restringira os seus compromissos à elaboração do artigo mensal para o Boletim dos Serviços Bibliográficos da Livraria Portugal, que escrupulosamente quereria manter, até como forma de continuar a assumir a sua participação cívica, ainda que dentro das reais possibilidades dos seus 90 anos. Com efeito, o último artigo que encerra este agora saído 5º volume de «Factos, Pessoas e Livros» respeita a Maio de 2005, ou seja, a dois meses antes da data da sua morte.
Pode assim dizer-se que JPM trabalhou até quase aos derradeiros dias da sua vida, uma vida extensa e rica de contributos para a Cultura Portuguesa, como já referi e como, modestamente, procurei salientar na nota bio-bibliográfica que redigi há mais de um ano, depois de ter aguardado da nossa Comunicação Social, algo de mais completo e preciso do que as magras e inexactas notícias que nela pude colher após a sua morte.
Que eu saiba, com as excepções do Centro Nacional de Cultura, que publicou uma nota breve mas equilibrada e correcta nos dados referentes a JPM, e da Academia Portuguesa da História, que, em 11 de Outubro de 2006, realizou uma sessão especial em sua memória, depois de, já no final de 2004, lhe haver promovido significativa homenagem, pela passagem do seu 90º aniversário, tudo o resto, Instituições e Comunicação Social, se destacou pela omissão, pela inexactidão e pela escassa relevância noticiosa com que o desaparecimento deste notável cidadão de dois séculos foi tratado.
Por desconhecimento da valia da pessoa em causa ou por desatenção cultural isso aconteceu. Pode e deve chocar-nos a brutalidade do facto, numa época em que tanto relevo vemos dar a ninharias, falsos valores e falsos ícones da nossa sociedade. Por isso mesmo, urge dar a conhecer aos Portugueses o nome, a obra e o nobre exemplo de cidadão de José Pedro Machado. Desde o seu falecimento que a Associação dos Antigos Alunos da Escola Industrial Afonso Domingues tem desenvolvido esforços nesse sentido.
Entretanto, ao terminar o Ano da Graça de 2006, eis que nos sobreveio uma comovente alegria : a de termos visto finalmente editado o tomo v da obra «Factos, Pessoas e Livros» do Prof. José Pedro Machado, com mais uma valiosa colectânea de artigos seus, escritos entre 1991 e Maio de 2005, ou seja, até dois meses antes da sua morte.
Para a sua publicação, um pequeno grupo de pessoas suas amigas se empenharam denodadamente, com destaque especial, para a direcção da AAAEIAD – Associação dos Antigos Alunos da Escola Industrial Afonso Domingues, que buscou e obteve os patrocínios necessários à edição do livro e para a Livraria Portugal, depositária dos originais do Professor, que sozinha havia editado os quatro anteriores volumes da obra.
Obra sem dúvida singular, no panorama livreiro do país, quer pelos temas nela tratados, quer, ainda mais, pelo longo período a que respeita, nela ficou assim reunida toda a colaboração que aquele preclaro Académico prestou no Boletim dos Serviços Bibliográficos da referida Livraria, desde o ano de 1953 até Maio de 2005.
Felizmente, todos os óbices foram removidos, incluindo os da revisão tipográfica, feita por esforços de amadores, no real sentido do termo, para suprir deficiências e anomalias numerosas, típicas destes trabalhos de edição. Mesmo assim, ainda algumas gralhas, poucas e sem influência na compreensão dos textos, passaram ao crivo desses diligentes esforços.
Serão naturalmente corrigidas em futuras edições, de acordo com aquele sagrado princípio em razão do qual se considera não haver outra solução para o erro senão a sua correcção, tão pronta quanto possível, ainda que, sobre o dito erro, possam aduzir-se as mais atendíveis justificações ou atenuantes. De resto, era esta mesma a doutrina preconizada e praticada pelo nosso saudoso Mestre.
Durante 52 anos, ininterruptamente, todos os meses, José Pedro Machado ali colocava, no referido Boletim, um artigo seu sobre Factos, Pessoas ou Livros que, no seu douto entender, mereceriam relevo, atenção ou leitura meditada, com realce para efemérides de nomes, factos ou obras de alto significado para a Cultura Portuguesa, embora também lá surgissem notas sobre temas da História ou das Letras Universais, da antiguidade oriental, da cultura greco-latina, mas também do Renascimento e do Romantismo, de outras épocas, correntes e estilos, da História à Literatura, à Filosofia, à Filologia, à Mitologia, à Toponímia, à Antroponímia, etc., etc.
Na verdade, ali se nos depara um conjunto vasto de temas que a sua enorme erudição lhe permitia tratar, com sínteses admiráveis, pela exactidão e pela concisão, duas características sempre perseguidas por quem pretende escrever com correcção e com clareza.
Neste último volume, até lá fui encontrar um artigo, de Junho de 1991, dedicado aos 200 anos do Sistema Métrico, empenho louvável de um grupo de sábios do tempo da Revolução Francesa, em que se incluíam os nomes prestigiados de Condorcet, Borda, Lagrange, Laplace e Monge, como refere JPM, no seu oportuno texto evocativo da efeméride.
Tudo ali era escrito numa prosa singela, escorreita, sem alarde de nenhuma espécie, porque este Mestre cultivava, em extremo, a simplicidade, a clareza e a objectividade, afinal atributos supremos da escrita que se quer universal, só acessíveis a poucos, aos que duramente persistem em laborar, sem desfalecimentos, nesta árdua faina das Letras, ainda que tenham nascido com inequívoca vocação literária.
Tudo isto JPM fazia, com escrupuloso zelo, a par dos múltiplos compromissos que assumia, sem beneficiar de bolsas, de licenças sabáticas ou de outras legítimas facilidades.
Cumprido este desiderato da edição do presente livro, falta-nos agora meter ombros à tarefa seguinte, que é a de reeditar os outros 4 volumes da obra, que só estarão disponíveis, eventualmente, em raras Bibliotecas ou em Alfarrabistas criteriosos.
Registe-se que estes livros eram e são distribuídos gratuitamente pela Livraria Portugal entre os seus mais antigos clientes e enviados a Estabelecimentos de Ensino, em Portugal e no Estrangeiro, como forma de difundir elementos da Cultura Portuguesa.
É, sem dúvida, numerosa a bibliografia de José Pedro Machado, de que já em vários artigos procurei dar conta. Permanecem, todavia, por recolher, identificar e agrupar muitos trabalhos que se acham dispersos por Revistas Culturais e por variados órgãos da imprensa nacional e regional.
Como Associação, de vocação também cultural, tudo continuaremos a fazer para divulgar o nome e a obra deste ínclito Português, de quem certamente se poderia dizer, com propriedade, que nada do que é humano lhe era estranho, à semelhança da sentença atribuída a Terêncio, famoso poeta latino do século II a.C.
Dos objectivos que nos propusemos alcançar, este, o da edição em livro dos últimos artigos escritos por JPM, é apenas o primeiro a ser atingido, porventura o mais fácil. Entre os restantes, figura o da atribuição do seu nome a uma rua de Lisboa, pedido já formulado à Câmara Municipal de Lisboa, aparentemente aceite, mas que aguarda despacho final.
Só pelos trabalhos que José Pedro Machado assinou sobre toponímia de Lisboa já se justificaria essa distinção, sem falar de outras obras igualmente relacionadas com Lisboa, cidade em que viveu mais de 80 anos como seu filho adoptivo.
Acalentamos ainda, como associação, outros objectivos que a seu tempo divulgaremos.
Em Faro, de onde JPM era natural, já este mencionado objectivo, embora por iniciativa de outrem, foi alcançado, figurando o seu nome honrado numa das artérias principais da capital algarvia. Outras localidades poderiam e deveriam fazer outro tanto, como Sintra, por exemplo, à qual JPM dedicou algum do seu vasto saber, em estudos e investigações que, a seu respeito, empreendeu.
Cumpre-nos prosseguir esta meritória campanha pela dignificação da memória de José Pedro Machado.
Como acima se salientou, num tempo tão escasso de verdadeiros talentos intelectuais e, sobretudo, cívicos, é justo que se procure perpetuar a memória de José Pedro Machado, para culto generalizado do seu alto exemplo de intelectual probo e cidadão sem mácula.
AV_Lisboa, 04 de Janeiro de 2007
PS : A todos os meus leitores, assíduos ou esporádicos, desejo que tenham passado um Natal Feliz, mais próximo da sua figura original, Jesus Cristo, do que da do comercial Pai Natal, com que a despudorada publicidade incessantemente nos pretende alienar, e que o Ano de 2007 possa trazer-nos a todos saúde e bons motivos de alegria, tanto no plano profissional, como no pessoal, no dos afectos, em particular, porque são estes que nos ajudam a viver com maior motivação e a ultrapassar as crises, as dificuldades, sempre presentes, na árdua labuta da vida.